Os ensinamentos da linhagem Kagyu no Tibete têm sido transmitidos há quase mil anos. Enquanto uma das quatro principais linhagens do budismo tibetano, a escola Kagyu é especialmente conhecida pelas suas profundas práticas meditativas, pela sua tradição de retiro rigorosa e pelos incontáveis indivíduos despertos que produziu.
Os ensinamentos da linhagem Kagyu remontam à antiga Índia, onde o yogi realizado Tilopa recebeu transmissões do buda primordial Vajradhara. Tilopa deu estes ensinamentos ao grande académico Naropa, abade no famoso mosteiro de Nalanda. No século XI, o grande tradutor tibetano Marpa realizou a primeira de três viagens à Índia, onde conheceu e estudou com Naropa. Marpa trouxe depois estes ensinamentos de volta ao Tibete, acabando por transmitir a linhagem a Milarepa, o seu aluno mais importante, que praticou estes ensinamentos até atingir a iluminação. Milarepa, por sua vez, passou a linhagem a Rechungpa e Gampopa.
Takpo Kagyu
Hoje, as mais conhecidas linhagens Kagyu são as que brotam de Gampopa, um dos dois principais discípulos de Milarepa. O treino inicial de Gampopa incluiu estudo e prática extensivos na linhagem Kadam, fundada por Atisha. Mais tarde, praticou exaustivamente e dominou os ensinamentos que recebeu de Milarepa. Gampopa combinou os ensinamentos destas duas linhagens e passou aos seus alunos o que havia aprendido. A união das transmissões Kadampa e Kagyu foi a contribuição ímpar de Gampopa para a escola Kagyu. Gampopa teve vários discípulos notáveis, alguns dos quais fundaram as suas próprias linhagens. Coletivamente, todas estas linhagens provêm de Gampopa e são referidas como Takpo Kagyu. Estas incluem a linhagem Karma Kagyu fundada pelo 1.º Karmapa, a linhagem Drukpa Kagyu fundada por Lingje Repa e a linhagem Drikung Kagyu fundada por Jigten Sumgon.
Karma Kagyu
Um dos alunos mais importantes e influentes de Gampopa foi Dusum Khyenpa, o 1.º Karmapa. Este mestre fundou o mosteiro Tsurphu no Tibete central e tornou-se o iniciador da linhagem Kagyu, também conhecida como Karma Kamtsang. As sucessivas encarnações do Karmapa mantiveram esta linhagem ao longo dos séculos, dando origem a uma série interminável de santos iluminados e estudiosos académicos – a linhagem mais antiga de lamas reencarnados no Tibete. O atual Karmapa é o 17.º, Orgyen Trinley Dorje, que de momento reside em Dharamshala, na Índia. Saiba mais sobre os Karmapas e a sua linhagem.
A Prática na Escola Kagyu
Os praticantes Kagyu começam tipicamente por praticar as práticas preliminares exteriores e interiores, chamadas ngöndro, em Tibetano. Estas práticas incluem uma série de exercícios contemplativos que ajudam a levar a mente das preocupações mundanas sobre a sua vida presente até à obtenção da libertação do sofrimento e à derradeira iluminação. Estas contemplações assumem, habitualmente, a forma dos “quatro pensamentos que transformam a mente”: 1) a preciosa vida humana; 2) morte e impermanência; 3) sofrimento de samsara; e 4) karma. Estas contemplações abrangem as práticas preliminares exteriores.
As práticas preliminares interiores desenvolvem-se sobre o primeiro conjunto de práticas, aprofundando o compromisso do aluno para com a via espiritual, expandindo a sua motivação, removendo obstáculos, criando condições positivas para a prática e recebendo as bênçãos da linhagem. Respectivamente, as práticas que realizam estes desígnios são 1) refúgio, prosternações e bodhicitta; 2) prática de Vajrasattva; 3) oferenda da mandala e 4) guru yoga. Estas são também conhecidas pelas 4 x 100.000, devido ao número de vezes que o aluno deve repetir certos elementos da prática. Quando estas práticas preliminares forem completadas, o aluno passará para as práticas de sadhana, que empregam visualização, recitação de mantra e outros elementos para transformar a perceção ordinária e impura numa visão mais refinada e iluminada da realidade. As práticas de fruição da tradição Kagyu são duplas. No primeiro conjunto de práticas – a via dos meios hábeis – o meditador aprende a dominar o poder das energias subtis presentes no corpo, através de uma série de práticas conhecidas como os Seis Dharmas de Naropa. A segunda forma de prática é conhecida como Via da Libertação. Esta via contém os ensinamentos do Mahamudra, em que o aluno é primeiramente apresentado à natureza da mente e, depois, familiariza-se com ela.